domingo, 17 de novembro de 2013

Somos os perdedores?





Por José Manuel Barbosa

O dia anterior a escrever estas linhas, vi o debate sobre o estado da Nação celebrado estes dias passados no parlamento do Hórreo. Como quase sempre nas últimas décadas é tudo muito aborrecido excetuando as intervenções do José Manuel Beiras que são as que lhe dão sabor ao debate. De tudo o que ele falou quereria salientar um ponto que me deu para pensar e consequentemente originou este artigo que estais começando a ler.
O professor Beiras é pessoa com uma importante lucidez mental e com o seu brilho particular deu a conhecer a sua vontade generosa ao manifestar que ele tinha escolhido o bando dos perdedores (Vídeo aqui). Evidentemente isso não pode sair duma pessoa débil. Quem é capaz de se pôr da parte dos perdedores tem de ser pessoa de carater poderoso, generoso e estar bem disposto a recebê-las dos média, sempre prontos a vilipendiar todo aquilo que vá contra o stablishment originado desde os 80 quando se criou a Galiza autonómica -auto-anémica que diria ele próprio-. Outros personagens políticos preferiram a segurança do poder porque necessitam ocultar as suas carências e misérias humanas, tanto inteletuais, quanto políticas ou morais, debaixo da asa protetora da grandíssima besta das sete cabeças que é o que representa esse poderoso construto estatal despótico qual leviatã devorador de tudo aquilo que se lhe puser por diante, onde levamos submersos muito mais tempo do que seria desejável por qualquer pessoa conhecedora e amante do Nosso País.
Mapa da Corrupção do PP
A hipocrisia, a bastardia, os complexos, a corrução e a malícia ficam ao descoberto sempre nas figuras de quem nos têm governado os últimos quase trinta anos -embora nestes últimos tempos com mais baixeza do que nunca-, com personagens de nova geração que nunca acreditaram em si próprios, nem no povo galego, mas ocultando essa mediocridade, acrescentada no facto de se refugiarem nas siglas falsamente populares dum poder sem princípios nobres. Por essa pratica desleal dos políticos que nos regem hoje e pelo abuso ao que estamos submetidos por parte dessa grei de políticos descastados, o professor Beiras identificou-nos aos galegos com os perdedores.... mas isso chegou-me ao fundo. Perdedores, talvez, porque não estamos numa situação de libertação mas tudo o contrário...
Para o galeguismo oficial os obstáculos a vencer são dous: o sistema e o nacionalismo espanhol. A resposta desse galeguismo oficial ou institucional é a oposição visceral contra estes dous elementos como se fossem um só. Lógico, se esse galeguismo se tem definido como “nacionalismo de esquerdas”, mas duvido da sua lógica se de efetividade e de eficácia estamos a falar.
Desde os anos 60, o galeguismo tem sido um nacionalismo de barricada, de resistência, nunca um movimento com vocaçao de poder. Isso tem feito com que os partidos políticos com certo sucesso nestes últimos trinta anos -a maior parte deles integrados no BNG durante os anos 80, 90 e durante algo mais de uma década do século XXI-, tenham sido mal tratados e mal considerados desde todos os médios de comunicação, discriminados, manipulados e até abusados legalmente porque esses dous inimigos -sistema e nacionalismo espanhol-, aliados entre si têm colaborado estreitamente fazendo impossível botar abaixo tal construto. A sociedade galega tem ido de cara à desnacionalização nestas últimas três décadas muito mais rapidamente do que nos anos de Franco e de forma mais eficaz do que nos chamados Séculos Obscuros. A aliança anti-galega -sistema e nacionalismo espanhol- têm-se apresentado como invulnerável e invencível com um PP no poder como o PRI em México, intratável e burlador, corruto e totalmente desleal. Aliás, o PSOE, partido nada vinculado com os interesses do País (contrariamente ao seu homólogo catalão o PSC) age como colaborador do PP e obstaculizador do nacionalismo, com pouca ânsia de governar quando lhe corresponder e favorecendo o fora de jogo dos seus inevitáveis aliados de governo nacionalistas. O BNG em minoria e desempoderado foi sempre objeto de maltrato político e legal, evidenciando uma falta de eficácia importante a respeito da necessária construção nacional tão necessitada pelo Nosso País. Só duas ligeiras esperanças foram as que nos fizeram abrir os olhos estas últimas décadas: a última foi quando o Bloco chegou a ser segunda força política, pronto a governar e a primeira quando aquela histórica Coligação Galega chegou prometendo nacionalismo e governabilidade homologando-se assim aos sempre eficazes PNV basco e CiU catalão.
Ambas as esperanças morreram. A última por má gestão do Bloco e a segunda por uma muito boa gestão caciquil do PP comprando a vontade e a adesão dos daquelas nomeados “coagas” mais facilmente subornáveis. A gente digna da C.G. ficou no partido, mas fora do parlamento e sem qualquer hipótese de recuperarem os assentos do Hórreo.
Entretanto a Catalunha e o País Basco caminhavam de cara a sua construção nacional com a força suficiente como para pôr em apuros Madrid até o ponto de chegarmos ao momento no que estamos hoje, falando de independências e de criação de novos Estados livres na Europa fora do poder madrileno. Mas a isso chegou-se porque o nacionalismo catalão não se confrontou com o sistema ou pelo menos porque não mesclou a luta anti-sistema com a luta de construção nacional. A prioridade foi a reivindicação do direito a decidir em favor da construção nacional e não o confronto com um sistema, quer dizer, optaram pela luta política contra o inimigo mais assumptível: o poder madrileno. Confrontar dous poderosos inimigos ao mesmo tempo não ajudou nunca nada.
As circunstâncias criadas por trinta anos de cousas bem feitas ajudam na reivindicação da autodeterminação. Por outra parte se o povo catalão conseguir a sua soberania estaria em condições de atender ao outro problema, o sistémico, organizando-se conjuntamente com outros povos livres para botar-lhe à mão ao pescoço a uma situação mundial que se manifesta “anti-pessoas”. Botar abaixo um sistema dentro do próprio país desde a condição de nação sem Estado não é viável nem possível, ainda que se atenda essa necessidade... A falta de soberania impossibilita mudar as estruturas interiores porque sempre há um poder acima, o do Estado Central, que corta toda iniciativa. Sim é viável, em troca, modificar as próprias estruturas quando o País é soberano e mesmo pode colaborar com outros países soberanos desde os movimentos sociais para trocar um capitalismo neo-feudal por uma forma mais humana de nos organizarmos.
Na Galiza ainda não se tem visualizado claramente que há dous inimigos e aliás duas frentes com diferentes prioridades. O mais imediato problema que obstaculiza o nosso desenvolvimento é o poder madrileno e é por isso que não podemos permitir-nos que o Estado se alie com o sistema... ou dito de outro jeito: o galeguismo deve abrir as portas de imediato a uma opção política que não seja anti-sistema com o objetivo mais imediato de inutilizar a agressão menos difícil de neutralizar. O leque partidário deve estar completo. A esquerda nacionalista já existe e mesmo com um certo sucesso comparado com outras forças nacionalistas de esquerda de outras nações sem Estado. Falta no parlamento galego a versão denominada de centro-direita. As contradições do regime nacionalitário espanhol são bastante menos difíceis de pôr em evidência do que pensamos se os esforços se fizerem tanto desde a banda esquerda como desde a banda direita.
Numa situação partidária coxa na que todo o esforço dos galeguistas se exprime desde um posicionamento estritamente de esquerda não faz possível a saída da situação na que estamos e desde a que recebemos golpes por todos os lados. Não estamos defendidos com este nacionalismo que ataca sempre pela mesma banda, a banda que está melhor defendida pelo oponente. No entanto, com todas as opções presentes, o jogo partidário é mais ágil, mais fácil, as maiorias absolutas do PP mais difíceis, o progresso da sociedade galega mais viável, a desgaleguização da sociedade por parte das forças políticas não-galeguistas mais difícil e a democracia mais real. De continuarem as cousas tal qual são hoje é fácil que deixem de ser uns imperialistas fracassados mais tarde ou mais cedo. Isso sabia-o muito bem Manuel Fraga que muito inteligentemente foi contra a Coligação Galega no seu dia. Ele sabia que era desde esses posicionamentos políticos donde poderia vir uma situação similar ou parecida à que está a acontecer em Catalunha porque o sistema poderia aceitar uma Galiza livre dentro do sistema mas não se permitiria nunca uma Galiza governada por marxistas.
O nacionalismo dos últimos trinta anos leva sido pouco prático, quer porque o galeguismo de centro-direita não soube manter-se, quer porque o de esquerdas não permitiu que nascesse nada à sua direita com muito pouca visão “de Estado”. O BNG pôde ter favorecido forças à sua direita e mesmo teria sido bom para ele mas isso não o viram os seus dirigentes obcecados nos seus posicionamentos estreitos. Um nacionalismo com mais dum 20% do voto não solucionou nem vai solucionar nunca nada. Sim solucionaria, todavia, junto com uma representação dum 20 ou um 30% doutro partido como pôde ter sido C.G. Se essa possibilidade fosse favorecida desde um BNG aberto e mais imparcialmente galeguista, a desgaleguização linguística, social, económica, cultural e política não teria sido possível e a ordenação e governação do Reino teria sido outra, podendo ter sido capazes entre todos duma transformação do espaço político estatal no que nos mexemos na direção dum Estado Plurinacional como o é Suíça ou Bélgica. Essa situação de controlo do poder central não teria favorecido maiorias absolutas abusadoras e teria facilitado em troca, coligações em governos plurais onde todos pudéssemos caber inviabilizando indesejáveis neo-franquismos como o atual. Se essa visão histórica tivesse sido similar ou parecida à que estamos a desenhar aqui dum ponto de vista teórico por ter sido viabilizada no seu dia por um nacionalismo com pensamento “de Estado”, provavelmente hoje estaríamos num contexto político no que nada teríamos de invejar de Catalunha e portanto não estaria o Professor Beiras lembrando-nos a sua dolorosa e generosa escolha em favor dos perdedores. Perde-se porque as estratégias são as erradas.

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